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Comments Off A Jogar… #3
Sonic Generations (PC), Sonic Team/Devil’s Details
Generations, e outros subtítulos como Gaiden ou Densetsu, tendem a criar um distanciamento desnecessário e são muitas vezes usados para acalmar crianças que rejeitam qualquer tipo de mudanças feitas aos seus jogos favoritos – mesmo que o resultado sejam títulos mais diversos ou aventureiros do que os seus conterrâneos tépidos e portadores de uma qualquer continuidade. É o tipo de palavra que resulta em almoços à borla para executivos apaixonados por folhas de cálculo por ser vendável, seguro e passível de descrever praticamente qualquer coisa – desde conjuntos de Lego ao amor que a Nintendo passou a nutrir pelos idosos, ou dos Rolling Stones à Pepsi.
Mas aqui, o contexto é o de um clube “só para membros”. Aqui está Sonic, a derradeira mascote dos jogos de mascotes que, talvez melhor do que qualquer outra, ilustrou a história da sua companhia quase na perfeição, desde o estrelato à lama, a fazer a sua melhor pose convidativa mas conservadora. Quaisquer que sejam os vossos sentimentos pelos jogos anteriores do ouriço azul, a Sega pensou em todos ao condensar 20 anos de história de Sonic num único título. Todos estão convidados. Para o melhor e para o pior.
Comments Off Em arcos-íris
Breves notas sobre os temas e apresentação de Phantasy Star Online (inclui spoilers)
A tristeza enevoada das Cavernas de Ragol dissipa-se por um momento quando encontramos arco-íris nos seus corredores inferiores. A presença de criaturas ferozes pouco subtrai ao momento; mesmo que atormentado pela doença no seu âmago, o planeta oferece vislumbres da sua maravilha e beleza, bem como outros elementos que, como este, pontuam e trazem significado às suas profundezas longas e minimalistas.
Phantasy Star Online foi a tentativa desesperada de Yuji Naka e da Sonic Team de provar a extensão e potencial do serviço online da Dreamcast a um mercado desacostumado a este tipo de jogos. Esta época também marcou o que muitos consideram como o período mais criativo da Sega antes de esta ter deixado a produção de consolas. O que é verdade, até certo ponto.
Por um lado, houve Jet Set Radio; se a indústria tivesse prestado atenção, Assassin’s Creed podia ter sido sobre espalhar zen urbano com a benção de Grandmaster Flash em vez de facadas nas costas de alguém. Por outro, houve Shenmue, talvez o primeiro equivalente a um “arrasa quarteirões” de Hollywood nos videojogos sobre marinheiros, cuidar de gatos e conduzir empilhadoras; se a indústria não tivesse prestado atenção, Heavy Rain poderia ter sido mais interactivo do que Space Ace. E depois houveram coisas para além do alcance, quer geográfico quer cultural, de jogadores ocidentais como SegaGaga, melhor descrito como um “mockumentary” da Sega, sobre a Sega.
O primeiro contacto com PSO era feito de futurismo, mas de um modo pouco vistoso. Tal com a série de 16-bits que o precedeu, os seus tons de fantasia científica eram desiguais. Apesar da Pioneer 2, o núcleo do jogo, parecer um microcosmo saído de Blade Runner, e de tecnologia avançada se infiltrar na sua apresentação e temas, era confortavelmente fantasia medieval, só que pintada a néon. Até tematicamente: engenharia genética e conspirações governamentais decorriam num mundo onde era possível destruir um deus com uma frigideira. Se isto parece pouco sofisticado, nada temam – também era possível usar um wok.
Comments Off In rainbows
Small notes on Phantasy Star Online’s themes and presentation (spoilers included)
The foggy gloom of Ragol’s Caves lifts up for a bit when you find rainbows further below its corridors. The presence of ferocious creatures does little to take away from the moment; even plagued by a disease at its core, the planet still gives glimpses of its wonder and beauty, and other such elements punctuate and give meaning to its otherwise long and minimalist depths.
Phantasy Star Online was Yuji Naka and Sonic Team’s desperate attempt to prove the breadth and potential of the Dreamcast’s online service to a market largely unaccustomed to such games. This period also marked what some believe to have been Sega’s most creative period before they left console development behind. This is true, to an extent.
On one hand, there was Jet Set Radio; if the industry had payed attention, Assassin’s Creed might have been about spreading urban zen with Grandmaster Flash’s blessing rather than knives to someone’s back. On the other, there was Shenmue, perhaps videogames’ first equivalent to a Hollywood “blockbuster” about sailors, cat grooming and forklift driving; if the industry had not payed attention, Heavy Rain might have been more interactive than Space Ace. And then there were things beyond the reach of most western players, both geographically and culturally, such as SegaGaga, better described as a mockumentary by Sega, about Sega.
The first contact with PSO was made of futurism, though one that kept its head down. As with the 16-bit series that preceded it, the science-fantasy tones were uneven. While Pioneer 2, the game’s hub, seemed a Blade Runneresque microcosm, and advanced technology did seep into the overall presentation and themes, it was comfortably medieval fantasy through and through, only one coated in neon. Thematically, even: genetic engineering and government conspiracies took place in a world where it was possible to destroy a god with a frying pan. If this seems unsophisticated, take heart – you could also use a wok.
2 Isto Não é um Manifesto do Novo Glitch
Notas sobre horror involuntário, histórias de assombrações, erros vs. intenção
(O artigo que se segue contém spoilers sobre Silent Hill 2 e Eternal Darkness)
Aqui está uma história de terror se quiserem acreditar nela.
O cenário é a versão de 1999 de Alien vs. Predator da Rebellion, ao longo dos corredores do nível Derelict enquanto Alien. Este é considerado um nível de bónus, apenas desbloqueado depois de jogar vários níveis na campanha singleplayer.
Depois de comprar o jogo não conseguia parar de jogar durante horas, dias, meses. Não desistia até cronometrar níveis com o Alien a alta velocidade, a aprender os caminhos e movimentos ideais para cada cenário. Percorrer aqueles corredores e paredes a 360 graus era uma emoção que Descent nunca conseguiu suscitar e passava dias a jogar como um xenomorfo, a provocar Marines e civis enquanto desbloqueava opções como dentadas à distância, o equivalente a ser um atirador furtivo Alien.
No entanto, a provocação tornou-se num castigo. Lembro-me de um dia passado a jogar continuamente durante horas e o meu computador a zumbir como um Sopwith prestes a rebentar. Mas estava a divertir-me demais a tratar os humanos como marionetas, a esconder-me nas sombras, a encenar guerras relâmpago contra os Marines e depois fugir; conseguia ouvir os gritos deles a ecoar pelos corredores enquanto fugia para evitar o fogo das suas armas. A dada altura, algo aconteceu. Os Marines começaram a gritar e a fugir mais vezes.
E faziam isto mesmo quando estava a milhas de distância.
Um “wtf?” juvenil passou pela minha cabeça e decidi investigar, não deixando de parte tácticas de intimidação e refeições ocasionais. Recordo claramente ver algo que não tinha presenciado até então: um Marine a largar a sua arma de fogo e a fugir. Aquele “wtf?” estava agora em letras maiúsculas. Outros soldados mostravam mais garra, a correr ao meu encontro e a disparar à queima-roupa. Um rodopio da minha cauda negra e algumas refeições vorazes depois decidi perseguir o Marine que escapou. Por esta altura tudo à minha volta era puro caos, com os Marines em lamentos dolorosos, a gritar, a implorar por misericórdia, a disparar contra tudo e nada. Empoleirado numa geometria grotesca dos anos 1990, não conseguia perceber o que se passava. Subitamente, ao longe, vi aquele que escapou, as suas mãos sobre a cabeça como um refém a correr pela vida num jogo Ghost Recon. Persegui-o por todo o mapa durante vários minutos, até que o perdi, e depois voltei a encontrá-lo – agachado perto de uma porta. Esgueirei-me até ele, rastejando silenciosamente. Quando estava perto o suficiente soltei o botão de agacho, erguendo-me como se estivesse a reencenar as criaturas nos filmes. A tremer, a respirar fundo, ele vira-se lentamente para mim e grita.
O jogo encravou mas o grito continuou.
E continuou.
E continuou.
E continuou até eu reiniciar o computador.
Hoje em dia a sua geometria pode ser simples, as expressões faciais dos Marines podem ser rídiculas, mas aquele medo quando confrontado com o inesperado foi bastante poderoso. Mal voltei a tocar no jogo desde então e não conheço ninguém que alguma vez tenha encontrado o mesmo erro; tentativas posteriores de repetir a situação foram um fracasso. O horror não intencional foi magnífico e em certa medida, muito mais assustador do que tudo o que jogo tinha para oferecer. E isto apenas podia acontecer num jogo – onde somos mais susceptíveis a acreditar em fantasmas na máquina. No blogue Five Players, Rich McCormick falou de como as histórias de terror estão a emergir a partir de videojogos, a substituir contos à volta da fogueira por perversões das memórias de infância que temos de jogos, e como partilhamos isso online. Em alguns casos tratam-se de glitches, encenados de modo a captivar a audiência.
O que pode o erro (o “glitch”) fazer pelos videojogos, além de benefício pessoal para quebrar um jogo? Considerando o glitch de AvP, e se aquilo fosse intencional, para mostrar um tipo diferente de causa e efeito, de potencial narrativo? E se a ideia tivesse sido aplicada conscientemente a outros jogos? Seriam necessários narradores e designers exímios para transformar a intenção num erro. Afinal de contas, se não é espontâneo e imprevisível deixa de ser um glitch – apenas uma função pré-determinada à espera de ser activada. É o efeito secundário, e não a intenção, que fazem dele um glitch. Mas poderá o design de videojogos aprender algo com o glitch?
10 This is Not a New Glitch Manifesto
Notes on unintended horror, spook stories, glitches vs. intention
(The following article contains mild and strong spoilers about Silent Hill 2 and Eternal Darkness)
Here’s a spook story if you want to believe one.
The setting is Rebellion’s 1999 Alien vs. Predator, along the halls of the Derelict level as an Alien. This is considered a bonus level, only unlocked after playing through several levels of the main singleplayer game.
After I bought the game I couldn’t put it down, playing it for hours, days, months. I wouldn’t let go until I was clocking levels with the Alien at blinding speeds, learning the optimal pathways and moves for each scenario. 360ing those walls and hallways was a thrill Descent never quite got right and I’d spend entire days playing as a xenomorph, taunting Marines and civilians while also striving to unlock options such as a long range head munch, which is like the equivalent of being an Alien sniper.
The taunting came back with a vengeance, though. I remember one day I had played it continuously for hours and my computer was whizzing like a sputtering Sopwith. But I was having too much fun making playthings out of the humans, lurking in the shadows, blitzkrieging Marines then running away; I could hear their screams echo across the corridors as I ran away to avoid gunfire. At some point, something happened. The Marines were starting to scream and run away more often.
They did this when I was miles away from them.
A juvenile “wtf?” crossed my mind and I decided to investigate, all the while still engaging in scare tactics and the ocasional meal. I distinctively remember seeing something I hadn’t witnessed up until that point: a Marine dropping his pulse rifle and running away. That “wtf?” was now coming on in capital letters. Other soldiers were more valiant, running up at close range and shooting point blank. A quick whirl of my black tail and some feeding frenzies later I chose to pursue the Marine that got away. By now everything was breaking down into chaos, the Marines whelping, screaming, begging for mercy, shooting at everything and nothing. Perched atop some freaky 1990′s geometry, I couldn’t understand any of that. Suddenly, in the distance, I saw the one that got away, his hands over his head like a hostage running for his life in a Ghost Recon game. I chased him all across the map for several minutes, then lost him, then found him again – cowering near a door. I inched up to him, crawling silently. When I got close enough I let go of the crouch button, standing tall in a reenactment of the creatures in the movies. Shivering, breathing heavily, he slowly turned around and screamed.
The game froze but the scream kept going.
And going.
And going.
And going until I had to do a hard reset.
Nowadays its geometry may be simplistic, the Marines’ facial expressions may be laughable, but that fear when confronted with the unexpected was very powerful. I barely touched the game since then and no one I know who played the game ever experienced this glitch; attempts to replicate it have been met with failure as well. The unintended horror was magnificent and to a degree, a lot scarier than what the game had to offer. And this could only happen in a game – where we’re more likely to believe there are ghosts in the machine. Over at Five Players, Rich McCormick wrote about how spook stories are now emerging from videogames, replacing campfire tales with perversions of childhood memories we have of games, and now they’re being shared online. In some cases they’re glitches, staged in a way that enthrall audiences.
What can the glitch do for videogames, other than bring personal benefit into breaking a game? Considering AvP’s glitch, what if it had been intended to work that way, to show a different kind of cause and effect, of narrative potencial? What if it had been consciously applied to other games? It would take keen storytellers and designers to turn the intention into a glitch. After all, if it’s not spontaneous and unpredictable it’s no longer a glitch – just a predetermined function waiting to be triggered. It’s the side effect, rather than intended use, that make it a glitch. But can game design learn anything with the glitch?